Hoje não me apetece sorrir.
Acordei ao cair da noite.
O corpo molhado do calor dos lençóis que cobriram o amanhecer secou.
Eleva-se a brisa. Bailam os papeis amarrotados ao vento. Dançam melodias imperceptíveis que dantes talvez ouvisse. Apaziguavam os gritos mudos que se manifestavam em revolta de tudo e todos.
Os lábios mornos e húmidos nos meus chegaram a acalmar os demónios que tentavam rasgar a pele.
O toque aqueceu a pele por momentos.
Refundiu-se um ser numa caverna escura, algures no âmago de um mundo de dor e gemidos tortuosos.
…
Ouve-se ecoar as minúsculas passadas dos roedores rastejantes. As unhas a baterem na pedra fria aos milhares. Guinchos ensurdecedores derramaram a primeira gota de sangue.
Acelera o batimento cardíaco, palpitam as veias cada vez mais fortes e o sangue aquece cada vez mais.
Ao longe já se sente o sopro das vozes que forçaram o adormecer para que um novo dia nascesse.
Escorre o suor pela pele e o cabelo molhado ao luar já não é o suficiente para acalmar o espasmo visceral do renascer do Grito.
Tornam-se olhos oceanos e a vista turva, tende a emergir apenas as peças ocas de um soalho que se vai destruindo aos poucos.
Os ratos saem do covil. Cobrem os jardins floridos num breu desassossego e pintam as paredes de um negro flutuante.
Escalam pelos corpos pacíficos e no alongar dos dedos pelo pescoço nasce uma nova razão…
As garrafas secam, os gargalos alargam e perde-se a melodia nos becos e ruelas sem cor.
Estende-se o lixo pelas ruas. Dejectos urbanos de vidas sem nome. Transbordam os esgotos e nos passeios andam os ratos cinzentos de orbitas amarelas e de unhas a faiscar pela calçada.
Sinto as unhas frias a enterrarem-se no peito… oiço os risos podres ao ouvido…
Escorrem pingos de sanidade que desbotam a tez…
Sinto o rasgar da pele.
Escorrem pingos de sanidade que desbotam a tez…
Sinto o rasgar da pele.
Acordo no meio de uma revolta rastejante… ou adormeço?...
Seja qual for a resposta, perante o que sinto e o sabor que trago na garganta, perante esta raiva que me invade a mente…
…Hoje não me apetece sorrir.
By Moon_T
4 comentários:
Caro Moon_T,
From me to you?! Honestly?! Wake up and smell the rotten coffee...
Qualquer que seja a resposta que te dêem, eu ou outra alma qualquer, mais ou menos adormecida, só a tua, que só tu sabes, será a correcta. Qualquer resposta que te possam vir a dar terá sempre uma vírgula, ou um ponto a mais para o teu ponto de vista. Tudo será de opinião subjectiva circundante o respectivo ponto de vista. As opiniões muito dificilmente serão impessoais...
Take a dive in your own abysm; before take a deep breath, it’s gonna take a while, and only then you will know YOUR answer.
Portanto, seja qual for o ângulo de visão, só tu saberás se preferes a dormência ou a inevitável revolta. Que poderá ser imediata ou somente quando tiveres preparado.
Ou será que vale a pena de todo acordar!? Mas para quem ouve os risos e vê as unhas... dificilmente ignora o dilacerar.
Sisudo Beijo,
leio e releio, quero comentar e não sei como... deixas-me sem palavras, inevitavelmente eu SORRIO!
beijo
Hoje, não me apeteceu sorrir... recordaste-me aquelas madrugadas frias que caminhava no regresso ao 'EU' e tudo à volta não fazia sentido nem era sentido. Ouvia o ecoar das vozes e dos sorrisos falsos, olhava rostos sem expressão pouco ou nada felizes, e apetecia-me gritar! Acordar daquele mundo que não era meu, embora fosse eu que habitava nele.
...
No dia que GRITEI, desabitei o mundo, apeteceu-me sorrir e hoje sou eu! ;))
...
A cada leitura que faço de ti, pausada, sem pressa, sem ruídos perturbadores, mas entusiasmada fico para ler o que vem a seguir.
Quando por aqui permaneço não me sinto nada!
As palavras flúem em velocidade proibida e a mente tenta entranhá-las num casúlo quase impossível! Sublimes demais, para não se partilhar...
Prometo que volto.
Um beijo. Meu.
O dia em que os sorrisos não sorriem porque na alma só existe o negro duma noite fria e cheiro a cabelo molhado!
Não sorrias então, deixa-te ficar na penumbra tambem tens direito a ela!
Beijo para ti
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