terça-feira, 23 de setembro de 2008

Memórias de um Outono (que há-de vir)














Na memória esconde-se a (des)ilusão.


O perfume soprado pela sala quase que se sobrepõe ao aroma do acelerar do coração.


Os lábios estalados e a garganta seca não deixam passar o sabor áspero do ácido que se hospedou no corpo. A cada gemido da máquina escorre mais uma gota ácida da ferida aberta que se mantém inacessível.


Ecoam músicas nos corredores… e gemidos… e gargalhadas e sorrisos… passam pelas brechas das janelas e pelas fendas das paredes. Rastejam sorrateiras e invadem-me a mente … deturpam as ideias. Ganham vida as imagens disformes de uma paisagem que vive para alem do Outono.


Outono que na natureza morta cerca as folhas secas e aguarda a incógnita do que há-de vir.
Memórias do que nunca foi...


Receios do que se apresenta diante dos olhos. Pendências que escorrem da relação que une a visão da realidade. A questão do que está realmente atrás do pano neste jogo de sombras bailarinas. Teses.


A ilusão de uma nudez pura, em que desliza toda a roupa pela tez, no escuro, sentindo o calor dos corpos. No entanto ao toque, embora se sinta a seda, por muito delicada que seja a roupa, não desnuda. Enquanto a pele não sentir a carne, o pano não cai e as sombras serão sempre a incógnita na linda peça por detrás do pano. O Outono pinta as ruas de castanhas folhas onde se irão um dia despir as sombras, dando lugar ao calor de dois corpos, nus.


Assim quero acreditar. Até lá recosto-me, rasga-se-me a roupa ao ver o jogo de sombras que a queda das folhas revela, tranquilo… e sem frio.



Memórias do que nunca foi… Memórias de um Outono que há-de vir.




By Moon_T

8 comentários:

Vitória disse...

Estás melhor que nunca, adoro o teu "arrojo".;)

Beijo

Pearl disse...

Memórias do que há-de vir de mansinho mas tão ligeiro quanto a música que se ouve neste teu post...


beijo

(in)confessada disse...

as saudades do que nunca se chegou a viver são, seguramente, as mais difíceis de (di)gerir


beijo confesso

ivone disse...

"Mais do que tudo, odeio
Tantas noites em flor da Primavera,
Transbordantes de apelos e de espera,
Mas donde nunca nada veio."


mais de sophia de mello breyner



mais do que tudo odeio tantas noites de verão donde nunca nada veio mais do que tudo odeio noites de outono donde nunca nada veio mais do que tudo odeio noites de inverno donde nunca nada veio




ps: só hoje respondi ao que me disseste a oito de setembro

Freyja disse...

Caro Moon_T,

"Até lá recosto-me, rasga-se-me a roupa ao ver o jogo de sombras que a queda das folhas revela, tranquilo… e sem frio."

Folgo em saber que ao menos,estás tranquilo.



Hoje li.

Cadentes Cumprimentos,

Anônimo disse...

A tua escrita não é escrita, são cheiros,sons,imagens,sentimentos...que nos envolvem,nos arrebatam e nos fazem desejar fazer parte desse universo de palavras, ainda que não sejamos mais que uma virgula ou um ponto de exclamação.
Saudações esperançosas que o outono seja luarento.

Anônimo disse...

Um Outono... e eu!



Beijo.

Misantrofiado disse...

Tu escreves muito Moon e ainda por cima bem.
Exibes uma coragem da qual não sinto saudade. Uma que fechei numa gaveta não sei muito bem qual mas também não interessa. Basta saber que a tenho em cativeiro.
É uma delicia… perscrutar a epiderme das folhas e a seiva de um vocábulo líquido, notavelmente dedilhado por uma alma perene.

Soube-me a prata, esta manifestação de (des)ilusão.

Abraço

Also...

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